Game Over

“Aperta o pause aí!”

Lembro-me muito bem, como se fosse hoje: eu aguardando devidamente uniformizado meu pai chegar do trabalho para jogar bola comigo.
Pra mim, aquele era um momento mágico, em que eu podia brincar de ser um ídolo, experimentar os dribles e jogadas que tinha ensaiado durante o dia. Jogar com meu pai, naquele momento, era o maior clássico da minha vida.
Jogávamos até não conseguirmos mais caminhar. Na verdade, ele sempre desistia. Não pelo meu preparo físico extraordinário, ou pela minha hiperatividade diagnosticada anos depois; era muito mais pelo cansaço de um dia estafante de trabalho. Mas eu vencia.

Hoje essa espera já não existe mais. As crianças não precisam imaginar seus ídolos. Eles estão ali, na sua frente, bem na TV, sob seu total comando. Estou falando de videogame, esse fantasma que segundo estudos recentes, faz o cérebro enviar estímulos de atividade física e em seguida de cansaço. Porém, esses estímulos se perdem entre um e outro aperto no botão.

Parece-me óbvio que uma criança habituada a comandar seus ídolos, vencer ícones do esporte, ser campeão mundial sem sair do sofá, não terá motivação alguma para jogar com seus pais. Ainda mais quando essa criança ou adolescente se experimenta em atividades reais e se frustra encontrando dificuldades de realizar o que para ele parece tão fácil nos jogos em sua TV. A partir dessa frustração, o corpo se torna um grande inimigo, pois todas as sortes de habilidades com as quais ele está acostumado nesses jogos são completamente incompatíveis, e na maioria das vezes impossíveis de serem realizadas de fato.

A tecnologia avança. Hoje, temos “games” que conseguiram unir o lado cognitivo com o motor, tirando o “atleta virtual” do sofá, aproveitando aquelas liberações de estímulos, fazendo-o se movimentar. Mesmo que tendo como espelho uma imagem irreal, enfim o lado sedentário já esta sendo resolvido.

Difícil, para mim impossível, vai ser substituir o lado afetivo, o toque, o carinho, a sensação de ter realizado algo verdadeiro, coisas que, por mais que a tecnologia evolua ou tente evoluir para esse lado virtual, serão sempre preteridas por mim em relação ao real.

E enquanto isso não chega... ”aperta o start aí!”
Sandro Braga.

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